Há 10 anos, a população santa-mariense acompanha os desdobramentos das obras de 10 creches que, ao integrarem a rede municipal de Educação Infantil, seriam capazes de ofertar, pelo menos, 2 mil vagas para crianças entre zero e 5 anos. Em 2012, as creches foram anunciadas pelo ProInfância, programa do governo federal, que contava com recursos de R$ 15 milhões para Santa Maria. Hoje, nenhuma das escolas de educação infantil (EMEIs) anunciadas pelo projeto está pronta, e tirar todas – ou parte delas – do papel é um desafio enfrentado por diferentes gestões.
No Rio Grande do Sul, o ProInfância previa a construção, reforma e aquisição de equipamentos e mobiliário para creches e pré-escolas públicas da educação infantil. O programa foi o responsável pelos recursos para 1,8 mil creches em território gaúcho. No Coração do Rio Grande, quando anunciadas, há uma década, a expectativa era que as escolas fossem finalizadas, no máximo, até 2014.
A empresa que venceu a licitação federal, a MVC, ficou responsável pela construção de 208 EMEIs em todo o Estado, entre elas, as de Santa Maria. Em 2015, já com atrasos, e com o início dos impasses entre a prefeitura e a MVC, o poder público municipal decidiu rescindir o contrato. A MVC prometia construções rápidas e modernas a partir do uso de uma tecnologia própria. Na cidade, a promessa era que, no máximo em cinco meses, as obras estariam construídas. Também responsável por outras creches no Rio Grande do Sul, a empresa não entregou nem 10% do total previsto.
Em 2012, o anúncio da construção de 10 creches em Santa Maria parecia ser a solução para a recorrente falta de vagas na rede municipal de Educação Infantil, problema que segue até hoje. Porém, as cinco creches que começaram a sair do papel, ainda não foram concluídas. Já as outras cinco não serão mais construídas.
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A funcionária pública aposentada Maria Martins, 72, mora há 17 anos no Residencial Lopes. Ela viveu a expectativa de ter uma creche quase em frente ao lar. Mas, depois da base construída, o que Maria presenciou foi o abandono da obra e, aos poucos, os materiais deixados ali começaram a ser furtados. Hoje, é impossível dizer que a área verde tomada pelo matagal e ponto de descarte irregular de lixo abrigaria uma das creches:
– Hoje a gente até duvida que aqui teria alguma escola, mas vimos os materiais de construção, o início dos trabalhos e até a base do piso que deve estar no meio de todo esse mato. Os moradores começaram a plantar árvores para deixar o local mais limpo e poder usar como uma forma de lazer. Até porque o mato fechado e o lixo podem juntar mosquitos da dengue e bichos perigosos – disse.
Já no Bairro Medianeira, quem presencia diariamente o abandono de uma estrutura apenas com o contra-piso construído é Nélio da Silva, 69, zelador que há oito anos trabalha nas proximidades e ajuda a cuidar do local:
– Quando comecei a trabalhar, essa estrutura já estava aqui. Tinha também alguns materiais de construção que foram sendo retirados, mas não sei se foi a empresa responsável ou se furtaram. Apesar da construção abandonada, o mato não tomou conta porque a prefeitura faz manutenção e, como zelador, mantenho limpa essa parte do meio-fio.
A prefeitura de Santa Maria afirma que trabalha para entregar à comunidade as cinco creches do programa até 2023.
CRECHES ANUNCIADAS PELO PROINFÂNCIA
Creche Monte Belo, na Cohab Fernando Ferrari, em CamobiCreche Santa Marta, na Nova Santa MartaCreche Diácono João Luiz Pozzobon, na MaringáCreche Residencial Lopes, no Residencial LopesCreche Medianeira, na MedianeiraCreche Vila Jardim, em CamobiCreche Menino Deus, no Campestre do Menino DeusCreche Dom Luiz Victor Sartori, no CentroCreche São João Batista, na Vila OliveiraCreche Estação dos Ventos, no KM3
Reequilíbrios financeiros quase triplicam o valor das obras
No final de março, o prefeito Jorge Pozzobom assinou uma ordem de serviço para a construção da EMEI da Vila Maringá, no Bairro Diácono João Luiz Pozzobon. Segundo o chefe do Executivo, o investimento será de R$ 3,5 milhões, com recursos próprios da prefeitura de Santa Maria. Ele diz que a creche deve ser entregue à comunidade em novembro deste ano.
Ainda, de acordo com Pozzobom, que assumiu a prefeitura em 2017, quando as obras do ProInfância completaram cinco anos desde o anúncio, o objetivo do poder público municipal é concluir as outras EMEIs, como a Monte Belo, em Camobi, e a Santa Marta, no Bairro Nova Santa Marta, além das creches Medianeira e Residencial Lopes, nos bairros Medianeira e Pinheiro Machado, respectivamente. As escolas receberam recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), do Ministério da Educação, no entanto, estão entregues ao tempo e tomadas pelo matagal.
Hoje, após reequilíbrios financeiros, as cinco creches do ProInfância, orçadas inicialmente em R$ 15 milhões (para a construção das 10), terão um investimento bem maior.
– As obras das creches Monte Belo e Santa Marta estavam orçadas em R$ 2,8 milhões, hoje, elas vão custar R$ 4,5 milhões. Isso é um exemplo de reequilíbrio financeiro e dos impasses que tivemos com as empresas contratadas. Agora, todo o dinheiro está garantido e, caso falte algo, a prefeitura vai desembolsar para que, em 2023, as creches estejam prontas – garante o prefeito.
Segundo o secretário de Elaboração de Projetos e Captação de Recursos, José Antonio de Azevedo Gomes, a estimativa para a construção de uma creche, atualmente, no município é de R$ 4,5 milhões. Assim, caso fossem construídas as dez escolas, seriam necessários R$ 45 milhões, três vezes a mais do que o previsto inicialmente.
As obras das EMEIs Santa Marta e Monte Belo estão paradas desde o fim do ano passado. Os projetos foram retomados em 2021, com novas licitações, vencidas pela K.A.J. Materiais de Construção Ltda, de Taquara. A mesma empresa também é responsável por construir a UBS Estação dos Ventos, no Bairro Presidente João Goulart, obra paralisada no mesmo período das creches.
O motivo das paralisações, segundo a prefeitura, foi o impasse nas negociações de aumento no valor dos contratos. A empresa alegou que o preço dos insumos necessários subiu abruptamente durante a pandemia, e que o valor contratado inicialmente não seria o suficiente para concluir a obra. Assim, a prefeitura de Santa Maria rescindiu o contrato com a K.A.J Materiais de Construção.
STATUS DAS OBRAS QUE TIVERAM INÍCIO
Creche Monte Belo, na Cohab Fernando Ferrari (Camobi) – contrato rescindido, 10% da obra concluída.
Creche Santa Marta, na Nova Santa Marta – contrato rescindido, 11% da obra concluída.
Creche Diácono João Luiz Pozzobon, na Maringá – em construção, 60% da obra concluída
Creche Residencial Lopes, no Residencial Lopes – em fase de atualização do orçamento. Licitação deve ser lançada ainda este ano, e a previsão é que em 2023 a creche esteja concluída
Creche Medianeira, na Medianeira – a licitação será lançada em agosto. A previsão é que em 2023 a creche esteja concluída
Obras que não serão mais construídas
Creche Vila JardimCreche Menino DeusCreche Dom Luiz Victor SartoriCreche São João BatistaCreche Estação dos Ventos
Cenário é de abandono e pouca perspectiva
Nas obras abandonadas, o cenário é composto por tijolos, blocos de concreto, areia e brita que estão sujeitos à ação do tempo, ao vandalismo e ao furto dos materiais de construção.
Segundo a prefeitura, as cinco creches que tiveram as obras iniciadas há uma década, devem, finalmente, ser concluídas até 2023. São elas a do Residencial Lopes, Medianeira, Monte Belo, Santa Marta e Diácono João Luiz Pozzobon. Entre as outras cinco, duas tiveram os contratos cancelados por parte da União e outras três não serão construídas em razão de uma reprogramação da Secretaria de Educação.
Outras duas, que foram construídas a partir do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com verbas da prefeitura e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), estão prontas. No entanto, as EMEIs Ivanise Jann de Jesus, no Loteamento Cipriano da Rocha, e Glaci Corrêa da Silva, na Vila Brenner, também passaram por longos capítulos de abandono até estarem abertas às crianças da comunidade.
Garantia de vagas
Se todas as creches tivessem saído do papel, Santa Maria teria um acréscimo de, pelo menos, 1,5 mil vagas para crianças de zero a cinco anos, em turno parcial.
Hoje, para suprir a necessidade do município, já que cerca de 900 crianças aguardam vagas em creches, a prefeitura recorre a compra de vagas em instituições particulares de ensino.
Recentemente, foi homologado um termo que tem como objeto o serviço de apoio ao ensino. São sete as instituições de ensino credenciadas que custarão mais de R$ 5,7 milhões para os cofres do município.
Creches do PAc foram entregues com uma década de atraso
Na gestão do prefeito Jorge Pozzobom, duas escolas de Educação Infantil foram entregues às comunidades. A Escola de Educação Infantil Ivanise Jann de Jesus, no Loteamento Cipriano da Rocha, foi inaugurada em setembro de 2019. No total, foram necessários cerca de R$ 2,3 milhões, com recursos municipais e federais. Com área de 1.118,48 m², a creche tem capacidade para 180 crianças e conta com oito salas de aula, banheiros adaptados, cozinha, vestiário para funcionários, lavanderia, sala multifuncional, sala de informática, sala de professores, secretaria, sala de direção, almoxarifado, banheiro para professores e pátio interno e externo para recreação.
A obra é uma das que estavam prometidas pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com verbas da prefeitura e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Até ser finalizada, a creche enfrentou diversos problemas. Entre eles, paralisações, rescisão do contrato com as empresas devido à morosidade na construção e abertura de novas licitações para a conclusão das obras. Iniciada em 2011, a escola era para estar pronta no final de 2012.
Em março de 2020, a prefeitura inaugurou, também, a EMEI Glaci Corrêa da Silva, na Vila Brenner, no Bairro Divina Providência. Na época, a escola tinha 102 crianças, de 0 a 3 anos, matriculadas. Com uma área total de 668m², a EMEI Glaci Corrêa da Silva teve um investimento de aproximadamente R$ 1,9 milhão e demorou aproximadamente 10 anos para ter as obras concluídas. Assim como a creche do Loteamento Cipriano, a escola de Educação Infantil também contou com verbas do PAC, da prefeitura e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.
ESCOLA IVANISE JANN DE JESUS
Onde – Loteamento Cripriano da RochaPeríodo em obras – Iniciada em 2011, com previsão de término no final de 2012. A creche, de fato, foi inaugurada em setembro de 2019Valor – R$ 2,3 milhõesRecursos – Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com verbas da prefeitura e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)Vagas – 180
ESCOLA GLACI CORRÊA DA SILVA
Foto: Equipe 0-40
Onde – Bairro Divina Providência, Vila BrennerPeríodo em obras – Iniciada em 2011, a construção foi abandonada em 2014. E, em 2020, foi inauguradaValor – R$ 1,9 milhãoRecursos – Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), com verbas da prefeitura e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)Vagas – Aproximadamente 100 vagas